Disciplinar é sobretudo ensinar

Perante os comportamentos difíceis das suas crianças, alguns pais sentem-se frustrados, culpados e até impotentes para lidarem com elas, levando a um desajuste emocional e à deterioração das relações familiares. Alguns comportamentos como as birras e os amuos, são de alguma forma normativos, porém constituem de facto um grande desafio para muitos educadores.

Quando a criança parece ter dificuldade em ouvir os pais, obedecer, cumprir regras e respeitar limites, os pais tendem a ficar emocionalmente desorganizados, acabando muitas vezes por ceder aos caprichos dos filhos, no sentido de reestabelecerem a tranquilidade de que necessitam. Por outro lado, os pais podem ficar muito zangados, com raiva, o que leva a que não consigam dar as respostas mais adequadas à situação. A disciplina positiva visa ajudar os pais a lidarem com os seus filhos e com os seus comportamentos por vezes desadequados, de uma forma mais adaptativa, benéfica e promotora do bem-estar e da harmonia familiar.

Foi socialmente aceite durante várias gerações, que os pais utilizassem a punição física como forma disciplinar os seus filhos. Hoje em dia, essa forma de punir é considerada uma forma de abuso, sabendo-se que as suas consequências são potencialmente negativas. Bater, para além de poder magoar a criança devido ao desequilíbrio entre a força e o porte de um adulto comparativamente à da criança, é também um exemplo de como resolver os problemas com recurso á violência, o que não é um bom modelo. Do mesmo modo, a recompensa material pode não ser a melhor forma de reforçar um comportamento positivo, sendo o elogio a opção mais recomendada. Contudo, e sem pretender adotar uma atitude extremista, há que ter noção daquilo que pode ser ou não uma agressão e daquilo que pode ser ou não uma recompensa material.

Os bons comportamentos são muitas vezes recompensados com doces, brinquedos, uma refeição preferida, tempo de écran, ou seja, algo que dá satisfação à criança e que está dentro das possibilidades dos pais. Os maus comportamentos são por vezes punidos com castigos corporais, como palmadas, puxões de orelhas, bofetadas ou gritos e abanões, estratégias muito eficazes no momento mas certamente pouco eficazes a longo prazo, uma vez que incutem o medo e não ensinam à criança nada de positivo. Também a retirada de privilégios é uma forma de disciplinar bastante comum. Ficar sem o brinquedo preferido, sem poder jogar ou ver vídeos nos dispositivos tecnológicos, deixar de poder ver televisão por um período de tempo ou ficar fechado no quarto, são exemplos de castigos por vezes utilizados pelos pais com o objetivo disciplinar os filhos.

A psicologia humanista teoriza sobre a possibilidade de se poderem utilizar um conjunto de “ferramentas” para ajudar as famílias a melhorarem o relacionamento entre pais e filhos, no que diz respeito à disciplina. Estas “ferramentas” baseiam-se no pressuposto de que as crianças beneficiam se aprenderem a cooperar, a autodisciplinarem-se, a responsabilizarem-se e a resolverem problemas. Este tipo de competências leva a que as crianças se desenvolvam de forma mais autónoma e confiante. A disciplina positiva assenta em cinco pressupostos claros e muito importantes para o sucesso da complexa tarefa de educar. Em primeiro lugar, disciplinar deve incluir firmeza mas também doçura e gentileza, bem como regras e limites bem definidos e coerentes. A disciplina positiva traduz-se no equilíbrio entre o autoritarismo e a permissividade, com vista á promoção do respeito mútuo.

Em segundo lugar está a importância atribuída à criança. Respeitar e saber ouvir a criança vai ensina-la a respeitar e saber ouvir os outros. Os pais são os primeiros modelos dos filhos, e estes tendem a repetir aquilo que observam.  Incluir os filhos nas decisões da família confere-lhes importância e o sentimento de pertença, fundamental para a cooperação necessária às relações familiares. Em terceiro lugar destaca-se a importância dos pais se conseguirem colocar no lugar dos filhos, ou seja, ter em conta o que estes sentem ou pensam de modo a poderem orienta-los na busca de soluções para os seus problemas e dificuldades. Em quarto lugar é de evidenciar a necessidade de oferecer às crianças a oportunidade de fomentar competências como responsabilidade, autocontrolo, empatia e respeito pelos outros, competências estas fundamentais no desenvolvimento psicossocial ao longo da vida. Por fim, mas não menos importante, está o facto de os pais poderem ensinar aos seus filhos a serem confiantes e a terem a possibilidade de aprender com os seus erros, evitando as críticas e os julgamentos.

Os fundamentos da disciplina positiva podem ser vistos como uma filosofia de vida, como uma forma mais adaptativa de enfrentar o enorme desafio da parentalidade, com todos os obstáculos que esta pode apresentar. Educar com respeito, amor, firmeza, responsabilidade, cooperação, afeto, rigor, aceitação, compaixão, envolvimento e empatia é educar de forma positiva. Desenvolver na criança a capacidade de autoconsciência leva a que esta evite determinados comportamentos, não por medo da punição mas sim por conseguir ter a consciência de que aquela não é a maneira correta de agir e porque lhe foram oferecidas e ensinadas as alternativas adequadas.

Disciplinar é mais fácil com amor, respeito, compreensão e tolerância!

Depressão ou distimia?

A depressão tem uma prevalência elevada nas perturbações do foro mental. Porém, nem tudo o que parece é. Há que avaliar cuidadosamente cada critério, cada conjunto de sintomas, uma vez que alguns podem ser comuns a mais do que uma perturbação.

A Distimia enquadra-se nas perturbações depressivas e caracteriza-se pela presença de humor depressivo durante a maior parte do dia, apresentado durante pelo menos dois anos em mais de metade dos dias. O seu diagnóstico assenta no relato subjetivo (ou por observação dos outros) de pelo menos dois ou mais dos seguintes sintomas: aumento ou diminuição do apetite; dificuldades de sono (ex. insónia); cansaço e/ou falta de energia; baixa autoestima; dificuldades de concentração; dificuldade na tomada de decisões e sentimentos de desesperança. No indivíduo com distimia, estes sintomas podem causar mal-estar clinicamente significativo e/ou défice social, ocupacional ou em qualquer outra área do seu funcionamento.

Associado á perturbação de Distimia pode também estar um mal-estar de cariz ansioso, melancólico ou até mesmo com características psicóticas. A distimia pode ter um início precoce, se os sintomas se manifestarem antes dos 21 anos, ou tardio, se após os 21 anos, e pode ir de ligeira a grave, dependendo da intensidade e frequência dos sintomas. A Distimia tem muitas vezes um início precoce e insidioso, (infância ou adolescência), e por norma um curso crónico. O início precoce está associado a uma maior probabilidade de perturbações da personalidade ou do abuso de substâncias psicoativas.

Os fatores de risco para a Distimia são multifatoriais, podendo ser genéticos/fisiológicos, ambientais (ex. perda ou separação parental) ou temperamentais, nomeadamente níveis elevados de afetividade negativa, maior gravidade dos sintomas, pior funcionamento global do individuo e a presença de perturbações de ansiedade ou perturbações do comportamento. A Distimia pode ter consequências marcantes na funcionalidade do individuo, dependendo do grau em que o afeta.

Fazendo uma comparação entre Distimia e Depressão, pode-se dizer de forma simples que a depressão surge muitas vezes de forma abrupta, habitualmente em consequência de um evento traumático, enquanto a distimia pode “instalar-se” de forma silenciosa, durante a infância ou a adolescência, podendo ser confundida com uma característica da personalidade. Em termos de sintomatologia, a Distimia apresenta sintomas tendencialmente mais brandos, sendo exemplo o pessimismo, a irritabilidade, a fadiga, a baixa autoestima, sentimentos de culpa, de insegurança, dificuldades na tomada de decisões e dificuldades relacionais. Na Depressão, os sintomas mais típicos são a apatia, a anedonia (falta de prazer em atividades anteriormente prazerosas), a tristeza profunda, o desalento, as dificuldades de concentração, de memória, a baixa produtividade e a ideação suicida.

Em termos terapêuticos, a Distimia habitualmente responde bem ao tratamento psicoterapêutico, visto que as sessões ajudam o paciente a lidar com os sintomas e a superar as dificuldades. Os pacientes distímicos frequentemente mantêm a sua funcionalidade, no entanto, em alguns casos pode ser também necessário recorrer à medicação para equilíbrio da bioquímica cerebral. Parece haver evidência de que a intervenção de orientação cognitivo-comportamental, apresenta uma boa eficácia em termos de abordagem psicoterapêutica. A facilitação da expressão emocional, o apoio nas tomadas de decisão, o treino assertivo, e a promoção do autoconhecimento, são exemplos de dimensões a explorar, que podem dar um ótimo contributo para o aumento da satisfação com a vida.

Dê atenção aos sinais, identifique os seus sintomas e, se for o caso, procure ajuda profissional para fazer uma avaliação psicológica. Cuide de si e viva com mais qualidade!

Fonte: DSM-V – Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (Quinta edição) de American Pshychiatric Association.

A cama dos pais

O Jorge e a Clara são um casal jovem com dois filhos. Uma filha de 7 anos e um menino de dois. Marcaram uma consulta de psicologia no “desespero” de não conseguirem tirar a filha mais velha da cama dos pais. “Há 7 anos que não sei o que é dormir sozinho com a minha mulher”, diz o Jorge, e a Clara esboça um sorriso tímido.

Após uma avaliação psicológica feita à criança, percebe-se que não há nenhuma perturbação com significado clínico, mas sim apenas uma questão comportamental, aparentemente fácil de resolver. Com uma estratégia relativamente simples, no espaço de uma semana a menina passou a dormir tranquilamente na sua cama, no quarto que partilha com o irmão.

Três semanas depois, em consulta, os pais referem: “Nós não acreditávamos mesmo que fosse possível, estamos muito surpreendidos mas muito felizes”! O comportamento da menina mantém-se até hoje. Já passaram 6 meses.

O meu filho é um adolescente!

A puberdade traz grandes e rápidas mudanças físicas, emocionais e sexuais, sobre as quais os jovens não têm controlo. Estas mudanças requerem uma adaptação e uma compreensão das mesmas, sendo por vezes difícil ao adolescente lidar com o seu corpo e com os seus pensamentos, o que pode conduzi-lo a sentimentos de ansiedade mas também ao isolamento social.

Perante algumas questões como “será normal a minha aparência’” ou “o que é que os outros pensam de mim?”, o adolescente toma consciência de si mesmo mas também pode sentir alguma angústia, pela inevitabilidade das mudanças com as quais está a ter que lidar, sem que muitas vezes esteja preparado para tal. Por vezes, a segurança e as certezas da infância parecem desaparecer, dando lugar á incerteza e à ansiedade. Estes sentimentos são normativos, desde que o jovem consiga manter a sua funcionalidade a aos poucos, adaptar-se a um novo corpo, a um novo modo de estar e de se sentir. Porém, alguns adolescentes, pelas suas características, demoram mais tempo a fazer essa adaptação, com custos elevados no seu bem-estar pessoal, familiar e relacional.

A adolescência pressupõe uma “montanha russa” de emoções, que oscilam entre a alegria ou o entusiasmo e a tristeza ou o desespero. Crescer é difícil e emocionalmente exigente, e por vezes os sentimentos de confiança e independência dão subitamente lugar ao medo e à insegurança. Durante a adolescência, os jovens desenvolvem-se emocionalmente através de uma importante mudança no modo como se vêm a si mesmos e como compreendem a sua identidade. Procuram identificar-se com diferentes estilos de vida, modos de vestir e de se comportar, mas o autoconhecimento e a sua afirmação enquanto indivíduos, é geralmente um processo lento, stressante e doloroso.

Em termos relacionais, na adolescência os pares assumem uma importância maior, perturbando por vezes a relação do jovem com a família. Se por um lado a relação com os amigos é importante pela lealdade e amizade intensa que está implícita, bem como pela partilha e pela possibilidade de se expressarem, por outro lado, os jovens passam a aceitar dos pais uma menor influência nas suas decisões, podendo criar conflitos, com maior ou menor gravidade. No entanto, á medida que o tempo passa, o jovem vai descobrindo sua própria identidade e o seu lugar no mundo. Na maioria das vezes, ao entrarem na idade adulta, as tensões e os conflitos de gerações tendem a dissipar-se e a família volta a assumir uma importância de maior relevo na vida do jovem adulto.

O que podem os pais fazer no sentido de ajudar os seus filhos a ultrapassarem esta fase de crescimento, e ao mesmo tempo se regularem a si mesmos perante situações de conflito geracional? Esta é uma questão que muitos pais colocam com grande pertinência, uma vez que com o passar do tempo, os adultos podem ficar um pouco esquecidos e “desatualizados” acerca das tendências das novas gerações. Em primeiro lugar, perante um comportamento que possa parecer algo desadequado, é importante que os pais possam dar um passo atrás e refletir acerca do que foi a sua própria adolescência e de como se comportavam, perante determinados desafios, bem como na forma como se relacionavam com os seus próprios pais. A tolerância é a palavra-chave. Racionalizar e analisar que comportamentos podemos admitir, por serem inócuos e não constituírem perigo ou ameaça, quer à integridade dos jovens, quer ao sistema de valores da família e da sociedade, pode ser um caminho.

Por outro lado, há que estabelecer e fazer cumprir limites, o que de resto, deve já ser um hábito que vem da infância. Por vezes os pais têm sentimentos ambíguos, no que diz respeito às regras a estabelecer nesta fase da vida dos seus filhos. No entanto, estas são fundamentais tanto para a harmonia familiar como para a estruturação da personalidade do jovem. As imposições dos pais por vezes causam revolta e rebeldia nos adolescentes, que podem responder com indiferença ou revolta. Quebrar regras faz parte também do processo de desenvolvimento, porém, como em tudo na vida, o difícil é encontrar o equilíbrio entre sermos pais intransigentes ou pais negligentes. Para isso há que ajudar os jovens a entenderem o porquê de determinada regra e a razão para certos limites. É importante que os pais deixem bem claros os seus valores e até onde é que estão dispostos a serem flexíveis, assim como informarem os filhos, acerca do que para os si é inaceitável.

É bom ter em atenção outros fatores que podem coincidir com o período de adolescência dos filhos, como por exemplo uma separação ou divórcio, um novo relacionamento de um dos pais ou de ambos, o aparecimento de novos irmãos, ou situações como a mudança de casa, de cidade ou de país. Também podem ser relevantes outros acontecimentos como a mudança de emprego ou a reforma dos pais. Estas são situações comuns e que não têm necessariamente que ser um problema, mas podem potenciar algum nível de conflito ou de dificuldade de adaptação dos jovens, num momento do seu desenvolvimento em que estão naturalmente mais vulneráveis. Todos estes exemplos, por si só são potenciadores de ansiedade e de alguma instabilidade familiar, pelo que para os adolescentes, podem-se tornar mais difíceis de ultrapassar e ser necessária uma ajuda extra.

Outro assunto que surge com a entrada na adolescência é o sexo. Se para a maioria dos jovens é praticamente impossível conceberem que os pais possam ter uma vida sexualmente ativa, também para os pais pode não ser fácil de aceitar a eminência da iniciação sexual dos seus filhos. Porém, será certamente benéfico que os jovens estejam informados, no sentido de evitarem situações de risco. Assim, aos pais pode caber o papel de educadores a este nível, falando abertamente com os seus filhos adolescentes, sem tabus mas com respeito, mostrando abertura para o esclarecimento de dúvidas e o debate de ideias. Temas como a homossexualidade, a contraceção, as doenças sexualmente transmissíveis e também os sentimentos e emoções, entre outros, poderão ser debatidos em família, com maior ou menor intimidade, consoante o tipo constelação e relacionamento interpessoal familiar. Deste modo, os jovens poderão sentir-se mais confiantes e mais preparados para fazerem as suas escolhas.

Seja tolerante e principalmente atento ao seu filho adolescente. Ajude-o a atravessar esta fase por vezes difícil e solitária.