Fumar ou parar? Eis a perturbação!

É sabido que o consumo de tabaco é responsável por inúmeros danos na nossa saúde, desde o aumento do risco de cancro ao aumento da propensão para os acidentes  vasculares cerebrais, entre outros malefícios. No entanto, embora deixar de de fumar traga muitos benefícios para a saúde e para a “carteira”, muitas pessoas têm grande dificuldade em fazê-lo.

O Tabaco é uma planta do género nicotínico, existindo cerca de cinquenta espécies diferentes. A Nicotina Tabacum, planta originária do continente americano, é a que ao longo do tempo tem despertado maior interesse. Historicamente, a sua utilização é difundida por toda a Europa, sobretudo por causa do grande e suposto valor terapêutico que lhe era atribuído. No entanto, aos dias de hoje, embora fumar seja uma prática socialmente aceite, ela envolve sérios riscos para a saúde, não só do fumador mas de quem com ele priva. O tabaco pode ser fumado ou mascado, tendo em qualquer uma das formas um potencial patogénico significativo. O grau de toxicidade do tabaco deve-se em grande parte à maneira como é consumido, assim como à intensidade da inalação que se faz desta substância. Quer pela inalação de monóxido de carbono através do tabaco fumado, quer pela absorção da nicotina e outros agentes carcinogéneos pelas mucosas, o consumo de tabaco é altamente nocivo.

 Algumas pessoas fumam pontualmente, em situações ou condições específicas mas sem nunca ficarem “viciadas”. Outras porém, por ação da utilização reiterada de tabaco, acabam por ficar dependentes da nicotina, o que leva áquilo que hoje se designa por uma perturbação de uso de tabaco. Esta perturbação está descrita no Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-V) e enquadra-se na categoria das perturbações relacionadas com substâncias e perturbações aditivas, que englobam várias classes de drogas como a cafeína, o álcool, a cannabis ou os opioides, entre outras. As várias substâncias referidas têm em comum o facto de, ao serem consumidas em excesso, ativarem diretamente o sistema de recompensas do cérebro, que está envolvido no reforço de comportamentos e na produção de memórias.

Ao invés de ativarem o sistema de recompensas através de comportamentos saudáveis e adaptativos, os indivíduos com utilização abusiva destas substâncias ativam diretamente as vias cerebrais de recompensas, o que produz uma sensação de prazer. Assim, pessoas com baixos níveis de autocontrolo (défice dos mecanismos inibitórios cerebrais), podem estar particularmente predispostos para o desenvolvimento de perturbações do uso de substâncias, entre as quais o tabaco, claro. Curiosamente, os comportamentos de jogo patológico ativam sistemas de recompensa semelhantes aos ativados pelo consumo das drogas de abuso, produzindo alguns sintomas comportamentais comparáveis aos produzidos pelo abuso de substâncias psicoativas.

A característica essencial  de uma perturbação de uso de substâncias, nomeadamente consumo de tabaco, consiste num conjunto de sintomas comportamentais, cognitivos e fisiológicos, que indicam que o individuo continua a usar a substância apesar da existência de problemas significativos com ela relacionados. O uso de substâncias psicoativas pode provocar alterações nos circuitos cerebrais, podendo estas persistir após a desintoxicação. Os efeitos destas alterações são observáveis através dos repetidos comportamentos de recaída ou do craving (ânsia de consumir) intenso. Os critérios de diagnóstico para uma perturbação deste tipo incluem o défice de controlo, disfunção social, uso de risco e critérios farmacológicos (tolerância e abstinência).

A perturbação de uso de tabaco encerra em si como já foi referido um conjunto de diferentes critérios para o seu diagnóstico, mais especificamente 11. Quantos mais critérios o indivíduo preencher, maior será a gravidade da perturbação, que pode ser apenas ligeira se cumprir apenas 2 a 3 sintomas, moderada se 4 a 5 e grave se mais de 6. A título de exemplo, podemos referir o forte desejo ou impulso pelo uso do tabaco, o uso continuado de tabaco apesar de saber ter um problema físico ou psicológico causado pelo mesmo ou quando o indivíduo refere a necessidade de quantidades acentuadamente crescentes de tabaco para atingir o efeito desejado.

A cessação abrupta do uso de tabaco, ou até mesmo a sua redução, pode conduzir a sintomas de abstinência, nomeadamente irritabilidade, ansiedade, dificuldades de concentração, aumento do apetite, humor deprimido ou insónia, o que produz um mal-estar clinicamente significativo, que vai comprometer a capacidade de parar ou de continuar a fumar. A redução destes sintomas pode ser feita através do uso de medicamentos  de nicotina, e, paralelamente, com o recurso á intervenção psicológica. Esta deverá ser desenhada individualmente, de modo a ajudar a pessoa a manter a motivação para a mudança,  a reformular as crenças relacionadas com o uso do tabaco, a aprender e treinar estratégias para lidar com o impulso e o desejo de fumar, levando em consideração os aspetos cognitivos, comportamentais e emocionais que estão envolvidos na utilização do tabaco por cada indivíduo.

Deixar de fumar é um desafio bastante exigente. Não o abrace sozinho, peça ajuda à Sua Psicóloga!

Fonte: DSM-V – Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (Quinta edição) de American Pshychiatric Association.

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