Enquanto psicóloga, tenho recebido com frequência pais que procuram ajuda por sentirem que perderam o controlo sobre os hábitos digitais dos seus filhos adolescentes. Jogos online, redes sociais, horas a fio em frente ao telemóvel ou computador… São queixas recorrentes. Muitos destes pais chegam esgotados, angustiados, com um sentimento de impotência e, não raras vezes, com a esperança de que a psicóloga tenha “a solução”. “Ele não me ouve, talvez ouça alguém de fora”, “Já tentei tudo, diga-lhe a senhora o que fazer”, “Ela só vive para o telemóvel, já não sei o que fazer”. Estas frases não são apenas desabafos, são gritos silenciosos de pais que estão em sofrimento, por vezes confusos sobre o seu papel e profundamente preocupados com o futuro dos seus filhos.
É importante, antes de mais, reconhecer este sofrimento. A parentalidade na era digital coloca desafios para os quais poucos adultos estavam preparados. A velocidade com que a tecnologia evolui, aliada à crescente complexidade das relações online, pode criar um verdadeiro fosso geracional. Muitos pais sentem que perderam a autoridade ou a capacidade de comunicar com os filhos de forma eficaz. Neste cenário, não é de estranhar que depositem na figura do psicólogo uma série de expectativas, por vezes irrealistas, na esperança de encontrar respostas rápidas e eficazes.
Perante os comportamentos difíceis das suas crianças, alguns pais sentem-se frustrados, culpados e até impotentes para lidarem com elas, levando a um desajuste emocional e à deterioração das relações familiares. Alguns comportamentos como as birras e os amuos, são de alguma forma normativos, porém constituem de facto um grande desafio para muitos educadores.
Quando a criança parece ter dificuldade em ouvir os pais, obedecer, cumprir regras e respeitar limites, os pais tendem a ficar emocionalmente desorganizados, acabando muitas vezes por ceder aos caprichos dos filhos, no sentido de reestabelecerem a tranquilidade de que necessitam. Por outro lado, os pais podem ficar muito zangados, com raiva, o que leva a que não consigam dar as respostas mais adequadas à situação. A disciplina positiva visa ajudar os pais a lidarem com os seus filhos e com os seus comportamentos por vezes desadequados, de uma forma mais adaptativa, benéfica e promotora do bem-estar e da harmonia familiar.
Foi socialmente aceite durante várias gerações, que os pais utilizassem a punição física como forma disciplinar os seus filhos. Hoje em dia, essa forma de punir é considerada uma forma de abuso, sabendo-se que as suas consequências são potencialmente negativas. Bater, para além de poder magoar a criança devido ao desequilíbrio entre a força e o porte de um adulto comparativamente à da criança, é também um exemplo de como resolver os problemas com recurso á violência, o que não é um bom modelo. Do mesmo modo, a recompensa material pode não ser a melhor forma de reforçar um comportamento positivo, sendo o elogio a opção mais recomendada. Contudo, e sem pretender adotar uma atitude extremista, há que ter noção daquilo que pode ser ou não uma agressão e daquilo que pode ser ou não uma recompensa material.
Os bons comportamentos são muitas vezes recompensados com doces, brinquedos, uma refeição preferida, tempo de écran, ou seja, algo que dá satisfação à criança e que está dentro das possibilidades dos pais. Os maus comportamentos são por vezes punidos com castigos corporais, como palmadas, puxões de orelhas, bofetadas ou gritos e abanões, estratégias muito eficazes no momento mas certamente pouco eficazes a longo prazo, uma vez que incutem o medo e não ensinam à criança nada de positivo. Também a retirada de privilégios é uma forma de disciplinar bastante comum. Ficar sem o brinquedo preferido, sem poder jogar ou ver vídeos nos dispositivos tecnológicos, deixar de poder ver televisão por um período de tempo ou ficar fechado no quarto, são exemplos de castigos por vezes utilizados pelos pais com o objetivo disciplinar os filhos.
A psicologia humanista teoriza sobre a possibilidade de se poderem utilizar um conjunto de “ferramentas” para ajudar as famílias a melhorarem o relacionamento entre pais e filhos, no que diz respeito à disciplina. Estas “ferramentas” baseiam-se no pressuposto de que as crianças beneficiam se aprenderem a cooperar, a autodisciplinarem-se, a responsabilizarem-se e a resolverem problemas. Este tipo de competências leva a que as crianças se desenvolvam de forma mais autónoma e confiante. A disciplina positiva assenta em cinco pressupostos claros e muito importantes para o sucesso da complexa tarefa de educar. Em primeiro lugar, disciplinar deve incluir firmeza mas também doçura e gentileza, bem como regras e limites bem definidos e coerentes. A disciplina positiva traduz-se no equilíbrio entre o autoritarismo e a permissividade, com vista á promoção do respeito mútuo.
Em segundo lugar está a importância atribuída à criança. Respeitar e saber ouvir a criança vai ensina-la a respeitar e saber ouvir os outros. Os pais são os primeiros modelos dos filhos, e estes tendem a repetir aquilo que observam. Incluir os filhos nas decisões da família confere-lhes importância e o sentimento de pertença, fundamental para a cooperação necessária às relações familiares. Em terceiro lugar destaca-se a importância dos pais se conseguirem colocar no lugar dos filhos, ou seja, ter em conta o que estes sentem ou pensam de modo a poderem orienta-los na busca de soluções para os seus problemas e dificuldades. Em quarto lugar é de evidenciar a necessidade de oferecer às crianças a oportunidade de fomentar competências como responsabilidade, autocontrolo, empatia e respeito pelos outros, competências estas fundamentais no desenvolvimento psicossocial ao longo da vida. Por fim, mas não menos importante, está o facto de os pais poderem ensinar aos seus filhos a serem confiantes e a terem a possibilidade de aprender com os seus erros, evitando as críticas e os julgamentos.
Os fundamentos da disciplina positiva podem ser vistos como uma filosofia de vida, como uma forma mais adaptativa de enfrentar o enorme desafio da parentalidade, com todos os obstáculos que esta pode apresentar. Educar com respeito, amor, firmeza, responsabilidade, cooperação, afeto, rigor, aceitação, compaixão, envolvimento e empatia é educar de forma positiva. Desenvolver na criança a capacidade de autoconsciência leva a que esta evite determinados comportamentos, não por medo da punição mas sim por conseguir ter a consciência de que aquela não é a maneira correta de agir e porque lhe foram oferecidas e ensinadas as alternativas adequadas.
Disciplinar é mais fácil com amor, respeito, compreensão e tolerância!
O estabelecimento regras e limites e o cumprimento dos mesmos, é fundamental para um bom desenvolvimento infantil, uma vez que facilita a aquisição de competências relacionais. Respeitar limites, ensina a criança a compreender a importância das regras sociais e potencia a sua autorregulação, promovendo o seu adequado relacionamento com os vários elementos dos contextos em que a criança está inserida.
São os adultos, na sua relação com as crianças, que lhes ensinam o que são e quais são, os limites de cada interação. Através da observação e imitação dos comportamentos dos adultos, as crianças aprendem com as reações e respostas dos mesmos perante os seus comportamentos e atitudes. No exercício da parentalidade, os pais devem ensinar mais do que punir, ou seja, em vez de agredir, ameaçar ou castigar a criança perante um comportamento desadequado, os pais devem chamar a atenção para o que está errado, no momento certo e logo que possível ensinar qual seria o comportamento adequado para a aquela situação. Assim, a criança tem a oportunidade de compreender o que fez mal e de aprender como fazer de forma correta, ou seja, de acordo com o que é esperado pelas normas da convivência familiar, cultural ou social.
Muitos pais e educadores acreditam que as suas crianças só lhes irão obedecer se gritarem, ameaçarem ou os castigarem. Perante comportamentos difíceis das suas crianças, alguns pais sentem-se frustrados, culpados e até impotentes para lidarem com elas, levando a um desajuste emocional e à deterioração das relações familiares.
Quando a criança parece ter dificuldade em ouvir os pais, obedecer, cumprir regras e respeitar limites, os pais tendem a ficar emocionalmente desorganizados, acabando por ceder aos caprichos dos filhos no sentido de reestabelecerem a tranquilidade de que necessitam, ou, por outro lado, podem ficar muito zangados, com raiva, e desse modo não conseguem por vezes dar as respostas mais adequadas à situação. A disciplina positiva visa ajudar os pais a lidarem com os seus filhos e com os seus comportamentos por vezes desadequados, de uma forma mais adaptativa e benéfica, promotora do bem-estar familiar.