Os tiques são movimentos involuntários ou vocalizações, geralmente de início súbito, breve, repetitivo, estereotipado, mas de caráter não rítmico. Frequentemente imitam um comportamento normal mas ocorrem muitas vezes fora de um contexto de atividade normal. O tique está geralmente associado a uma ânsia premonitória para realizar um movimento específico, ao mesmo tempo que se associa a uma sensação de alívio, uma vez realizado.
Os tiques motores mais comuns manifestam-se na face (ex. piscar os olhos, franzir o nariz ou a testa, morder os lábios, fazer estalidos com a língua) mas podem ocorrer em qualquer outra parte do corpo (ex. contrair os músculos do pescoço, dos ombros, da barriga ou fazer gestos involuntários com as mãos). Os tiques vocais podem ser sons sem significado (ex. limpar a garganta) ou emitir sons imitando outros sons já existentes, ou até mesmo alterações no discurso e linguagem, repetição de sons ou palavras, que podem em raros casos ser obscenas.
Os tiques podem ser simples ou complexos, conforme o número de músculos envolvidos e podem constituir 3 tipos de perturbações: a Perturbação Gilles de la Tourette (duração superior a 1 ano, existindo simultaneamente vários tiques motores e pelo menos um tique vocal), Perturbação de Tiques Motores ou Vocais Persistente/Crónica (duração superior a 1 ano, por vezes associados a défice de atenção e hiperatividade, que são sempre ou tiques motores ou tiques vocais e nunca os dois tipos em simultâneo) e a Perturbação de Tiques Transitória (tiques motores e/ou vocais com duração de pelo menos 4 semanas mas não superior a 12 meses consecutivos).
Geralmente as perturbações de tiques surgem antes dos 18 anos, sendo o mais frequente por volta dos 6 anos, podendo prolongar-se por toda a infância, adolescência ou mesmo toda a vida adulta, com fases de remissão (desde algumas semanas até mesmo vários anos), sendo a taxa de prevalência de cerca de 10% em crianças. Habitualmente os tiques desaparecem antes da adolescência, mas podem voltar em momentos de maior ansiedade e excitação. As causas apontadas para este tipo de perturbação prendem-se com alterações em determinados circuitos cerebrais e neurotransmissores (substâncias que fazem circular a informação no cérebro). Parece existir também uma componente genética e podem também estar associados ao abuso de substâncias, patologias do foro neurológico ou ainda, terem origem emocional e ocorrerem associados a situações traumáticas, servindo como alívio. Na maioria dos casos os tiques interrompem-se durante o sono. Embora geralmente os tiques sejam comportamentos conscientes, algumas crianças mais pequenas e por vezes até alguns adultos podem não ter consciência dos seus próprios tiques. Porém, com o seu desenvolvimento, muitas pessoas sentem o impulso ou a sensação corporal que antecede o tique motor ou vocal e uma sensação de alívio ou de diminuição de tensão após a sua expressão.
A gravidade da perturbação de tiques prende-se com a sua intensidade e frequência, bem como com o modo como esta condiciona a pessoa, biológica, psicológica e socialmente. Geralmente os tiques aumentam em situações de maior ansiedade e stresse diminuindo quando a criança está concentrada numa atividade específica ou quando está descontraída. Quando uma criança começa a apresentar tiques, os pais, professores e outros elementos constituintes dos seus contextos, deverão informar-se acerca do problema, de forma a poderem tranquilizar a criança, principalmente dizendo-lhe que o mais provável é que estes venham a desaparecer com o tempo. Embora por vezes possa ser difícil, ignorar os tiques e considera-los algo normal e passageiro, não lhes dar muita atenção pode contribuir efetivamente para que a sua evolução possa ser boa e possam desaparecer num prazo de meses. També não é benéfico chamar a atenção à criança, principalmente perante outras pessoas, de modo a salvaguardar a sua autoestima.
O ambiente familiar é muito importante para a criança. Se os pais conseguirem reduzir a tensão existente em torno da criança e aumentar a sua compreensão e afeto, poderão estar a contribuir para que o problema fique mais leve. Por outro lado, a criança não deverá ser sobrecarregada com atividades extracurriculares excessivas. Se a prática desportiva pode ajudar, ter tempo para brincar livremente de forma descontraída será decerto favorável para a criança. Os exercícios de relaxamento e de respiração podem também ajudar muito a lidar com o problema.
Quando os tiques são muito intensos com elevado grau de interferência na vida da criança, comprometendo os seus contactos sociais e o seu desempenho escolar, é fundamental procurar ajuda especializada para lidar com o prolema. Quanto mais precoce for a intervenção, melhores serão as possibilidades de recuperação. A intervenção nas perturbações de tiques poderá ser farmacológica e/ou psicológica, de acordo com a intensidade da mesma. A intervenção psicológica com maior eficácia demonstrada baseia-se nas técnicas cognitivo-comportamentais. O ensino e treino de estratégias de relaxamento podem ajudar muito a lidar com o problema e com os seus efeitos, ou seja, com o mal-estar que os tiques provocam e que se faz sentir, principalmente ao final do dia. O psicólogo poderá ainda ajudar a criança/adolescente a concentrar-se no tique, antecipa-lo e substitui-lo por um comportamento alternativo. O apoio psicológico pode ainda abarcar outros objetivos pois estas crianças/adolescentes podem apresentar também outras perturbações associadas e outros sintomas como a baixa autoestima ou dificuldades nas relações sociais. Se for o caso, a identificação do fator que estimula o surgimento dos tiques, poderá ser trabalhado no sentido de facilitar o seu desaparecimento.
Muitas condições médicas e psiquiátricas foram descritas como coexistentes com a Perturbação de Tiques, sendo particularmente comuns a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA) e a Perturbação Obsessivo-Compulsiva (POC). A intervenção medicamentosa, em alguns casos mais extremos pode ser uma necessidade, principalmente se os tiques aumentarem e se tornarem mais complexos. Em casos mais extremos, pode ser recomendado pelo pedopsiquiatra ou pelo neurologista, o recurso a medicamentos como neuromoduladores, benzodiazepinas ou antipsicóticos. Contudo, o tratamento para eliminar os tiques, somente se deverá aplicar, em casos em que estes interfiram significativamente nas atividades ou na autoimagem do indivíduo.
Fontes:
DSM-V – Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (Quinta edição) de American Pshychiatric Association.
http://www.movementdisorders.org/disorders/tics_and_tourette.php