Higiene do sono e qualidade do sono

Higiene do sonoOs comportamentos de higiene do sono são elementos do estilo de vida que influenciam de forma positiva ou negativa a qualidade do sono (LeBourgeois et al., 2005), ou seja, são essencialmente comportamentos que podem contribuir em benefício ou em prejuízo do sono.

Uma higiene de sono adequada inclui uma rotina na hora de deitar, dormir num ambiente confortável, sossegado e não poluído e a diminuição de comportamentos inibidores do sono, como é o caso do consumo de tabaco, cafeína e álcool antes de deitar. Faz ainda parte de uma boa higiene do sono, evitar envolver-se em actividades física, psicológica ou emocionalmente estimulantes, cerca de uma hora antes de deitar (Wolfson, 2002).

Das estratégias de boa higiene do sono já estudadas, as mais eficazes parecem estar relacionadas com a estruturação comportamental, como por exemplo estabelecer uma rotina regular relaxante antes de deitar, evitar o consumo de produtos que contenham álcool, cafeína ou nicotina quatro horas antes de dormir, manter-se longe de actividades estimulantes como trabalho ou estudo intenso, jogos de computador e programas de televisão violentos, bem como promover um ambiente de sono calmo e confortável, uma rotina regular de exercício físico e dieta saudável (American Academy of Sleep Medicine, 2005).

Na infância e adolescência, uma má higiene do sono é frequentemente o resultado de uma supervisão parental inadequada sobre a hora do deitar/dormir e de uma educação/informação insuficiente sobre necessidades de sono e comportamentos de sono adequados (Mindell & Meltzer, 2008). O papel dos pais ou cuidadores parece ser de extrema importância para uma boa higiene do sono, no sentido de garantir que os jovens tenham uma programação regular do sono – vigília, um ambiente de sono adequado e uma rotina de dormir que os prepare fisiológica, comportamental e emocionalmente para o sono (LeBourgeois et al., 2005).

Higiene do sono

Uma das práticas de má higiene do sono mais frequentemente encontradas entre crianças e adolescentes é o uso de dispositivos electrónicos (televisão, computador, tablet ou telemóvel) antes de deitar ou mesmo já no quarto e na cama. Isto vai aumentar o risco de uma menor duração do sono, aumento do tempo de latência para adormecer e uma redução na eficiência do sono. Os efeitos negativos da má qualidade do sono, da sonolência diurna e do aumento do tempo de ecrã em diferentes tipos de dispositivos, durante a adolescência, começam a ser considerados como uma questão de saúde pública (Mak, Wu, Hui, Lam, Tse, Yu & Wong, 2014).

Higiene do sonoO consumo de substâncias como cafeína, álcool e tabaco, principalmente após as 18 horas, é um hábito de má higiene do sono, comum a muitos adolescentes, com efeitos na qualidade do mesmo e no cansaço percebido. O consumo de álcool pode produzir um aumento da sonolência, começando cerca de 30 minutos após a sua ingestão e com uma duração de cerca de quatro horas, dependendo da quantidade de álcool consumido, mas em contrapartida o estado de vigília aumenta durante as últimas duas a três horas de sono, aumentando também a probabilidade da ocorrência de sonhos com carga ansiógena (ICSD, 2005).

Consequências da má higiene do sono

O sono inadequado é visto como uma experiência nociva que pode, com o tempo, alterar fundamentalmente o desenvolvimento da criança ou do adolescente, resultando por vezes num mau prognóstico a longo prazo (Beebe, 2011). Nos adolescentes, uma má higiene do sono reflecte-se habitualmente, num sono qualitativa e quantitativamente insuficiente e as suas consequências podem verificar-se a vários níveis: funcionamento cognitivo e desempenho escolar, comportamento e relacionamento interpessoal, mal-estar psicológico e perturbações do humor e mal-estar físico e saúde (Colten & Altevogt, 2006; Mitchell et al., 2013; Roberts, & Duong, 2014).

Um sono sem qualidade ou insuficiente conduz ao aumento da sonolência diurna, falta de atenção e provavelmente a outros défices cognitivos e comportamentais que afectam o funcionamento diurno, com possíveis implicações a longo prazo no desenvolvimento do indivíduo. A privação do sono nos adolescentes manifesta-se pelo aumento de horas de sono durante o fim-de-semana, impulsividade, humor depressivo e sonolência diurna, e está associada a um pobre desempenho escolar (Carskadon, 1998; Sunghan, Dueker, Gwendan & Goldstein, 2002; Wolfson & Carskadon, 2003).

Higiene do sonoUma das razões pelas quais o desempenho escolar pode ser afectado negativamente prende-se com o facto de o sono ter um papel importante na consolidação da memória de trabalho em crianças e adolescentes. O desempenho em tarefas abstractas e complexas que envolvam funções cerebrais superiores tende a piorar perante situações em que se verifica a privação de sono (Kopasza, 2010). Estudos revelam que de um modo geral, os adolescentes com notas mais altas são aqueles que reportam ter um sono mais regular e de maior duração (Carskadon, 1998; Roberts, Roberts & Chen, 2009; Siraj, Salam, Roslan, Hasan, Jin & Othman, 2014).

Parece haver uma associação complexa e provavelmente bidireccional entre sono e psicopatologia. Os resultados de um estudo de Roberts e Duong (2014) sugerem que o sono de duração reduzida aumenta o risco de depressão ao mesmo tempo que esta aumenta o risco do decréscimo da quantidade do sono. Uma investigação de Morrison, McGee e Stanton (1992), com adolescentes entre os 13 e os 15 anos, revelou que cerca de 25% dos participantes referia ter necessidade de mais tempo de sono e cerca de 10% da amostra referia ter dificuldade em adormecer. Estes adolescentes que relataram dificuldades de sono mostraram-se mais ansiosos, deprimidos, desatentos e com problemas de comportamento, comparativamente aos que não relataram problemas de sono.

Se por um lado o estudo e as exigências do dia-a-dia parecem associar-se moderada mas consistentemente com menos horas de sono noturnas, por outro lado, dormir menos, associa-se com a presença de níveis mais elevados de ansiedade, sentimentos depressivos e fadiga durante o dia (Fuligni & Hardway, 2006; McGlinchey, Kaplan, Dahl & Allison, 2010). Assim, os problemas do sono e a alteração dos padrões normais de sono foram identificados nas principais formas de psicopatologia da criança e do adolescente, que incluem não só depressão mas também ansiedade e distúrbios da atenção, entre outros (Alfano, Zakem, Costa, Taylor & Weems, 2009; Frediksen et al., 2004; Gregory & Sadeh, 2012).

Higiene do sonoParece haver também uma associação entre qualidade do sono e comportamentos suicidas. Um trabalho de Liu (2004) revelou que a taxa de prevalência de tentativas de suicídio estava negativamente relacionada com a duração do sono. A taxa foi de apenas 4,4% em adolescentes que dormiam nove ou mais horas por noite mas subiu para 20,9% naqueles que reportavam dormir menos de sete horas. Outro estudo de Winsler (2015) revelou que basta a diferença de uma hora a menos de sono durante os dias de semana para aumentar a probabilidade do indivíduo se sentir sem esperança e mais propenso ao abuso de substâncias.

A má qualidade de sono e a consequente sonolência diurna parecem também relacionar-se positivamente com o aumento da ocorrência de acidentes de viação nos jovens (Durmer & Dinges, 2005; Pizza, Contardi, Antognini, Zagoraiou, Borrotti, Mostacci et al., 2010; Short, et al., 2011).

Também a saúde física pode ser afectada pelos problemas de sono. Vários estudos destacaram uma ligação entre o sono e o aumento do índice de massa corporal, risco de obesidade e diabetes. O sono insuficiente tem efeitos ao nível da diminuição da tolerância à glicose, da sensibilidade à insulina, da diminuição dos níveis de leptina (hormona da saciedade) e do aumento noturno dos níveis de cortisol, que estão associados ao aumento do apetite (Knutson, Spiegel, Penev & Van Cauter, 2007; Knutson &Van Cauter, 2008; Spiegel, Knutson, Leproult, Tasali & Van Cauter, 2005).  Um estudo de Orzech, Acebo, Seifer, Baker e Carskadon (2014) indicou uma tendência para o aparecimento mais frequente de doença aguda em adolescentes com períodos de sono mais curtos.

Devido à elevada prevalência de dificuldades relacionadas com o sono, torna-se imperativo actuar a esse nível, dotando os jovens e os pais/cuidadores, de estratégias adequadas,  implementa-las e monitoriza-las, no sentido de melhorar a qualidade de sono dos jovens e prevenir futuras situações de doença física ou mental.

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