Numa situação de separação ou divórcio litigioso, o tribunal pode solicitar ao psicólogo, uma avaliação psicológica dos pais, com o objectivo de avaliar as suas competências e capacidades parentais, sempre que estejam em causa filhos menores.
O processo de avaliação visa obter informação sobre a personalidade dos pais, sobre os níveis de adaptação familiar, social e emocional e, sobretudo, compreender a capacidade dos mesmos no que concerne ao cuidar e educar os seus filhos. Esta avaliação deverá sempre levar em consideração o contexto familiar mais alargado, assim como as questões ligadas com o exercício de uma parentalidade adequada e responsável, no sentido de proteger a criança e garantir o seu adequado desenvolvimento. A decisão do tribunal acerca da custódia da criança, ou de eventuais restrições, irá ser fundamentada com base na avaliação efectuada aos pais, sobre as suas capacidades e competências enquanto cuidadores daquela criança, cujo superior interesse e bem-estar psicológico deverão ser sempre salvaguardados.
Para além de possuir competências teórico-metodológicas da área da psicologia, o psicólogo, em casos desta natureza, é obrigado a ter conhecimentos sólidos na área do direito, como por exemplo, ter conhecimentos acerca dos direitos da criança, das responsabilidades parentais, questões ligadas com a negligencia e a violência conjugal, entre outros temas pertinentes nesta área. Do mesmo modo, estes profissionais devem seguir diversas linhas orientadores, como o consentimento informado, a imparcialidade, a não discriminação ou preconceito, os conflitos de interesses que possam comprometer a objectividade ou eficácia da avaliação e a criação e manutenção de registos à luz dos padrões ético-legais, entre outras.
Devem ser contempladas na avaliação três dimensões importantes, sendo elas o ajustamento psicológico global, as práticas educativas e parentais e a qualidade do funcionamento e das relações familiares. Deve ser avaliada a compreensão cognitiva, a qualidade do discurso e a possível existência de problemas físicos, emocionais ou sociais, a qualidade dos cuidados prestados à criança, o tipo de interacções com a criança e os valores transmitidos nessas mesmas interacções, assim como a capacidade para o estabelecimento de regras e limites. São assim avaliadas as competências dos pais para responderem às necessidades da criança, avaliando a capacidade de suprir necessidades físicas (ex. alimentação, higiene…), de responder às necessidades cognitivas (actividades para promover o desenvolvimento das capacidades cognitivas da criança), sociais e emocionais (envolvimento e resposta emocional às necessidades afectivas da criança). Devem ser ainda avaliadas as competências pessoais dos pais, necessárias para o exercício de uma parentalidade responsável, como as competências físicas e de auto-cuidado, cognitivas (ex. capacidades de memória, inteligência geral, conteúdo e qualidade do pensamento, crenças, resolução de problemas e tomada de decisão), sociais (ex. relação com a família alargada, com o grupo de pares, com a comunidade, com a rede de suporte…), emocionais (ex. conflitos entre o casal, estilos de vinculação, relação do casal com a criança, comunicação e regulação emocional…) e comportamentais (ex. comportamentos de isolamento, violência, agressão, abuso de substâncias, rotinas…).
Em relação aos métodos de avaliação, é de extrema importância que se proceda inicialmente a uma consulta dos dados do processo, tendo em conta que se trata de um contexto forense. Na primeira sessão do processo avaliação devem ser explicitados os propósitos e os termos em que este decorrerá. O sujeito (pai/mãe) tem o direito de saber qual o número de sessões previstas, quais as pessoas que vão estar envolvidas, da confidencialidade e sigilo a que o psicólogo está obrigado a manter, entre outras informações que são firmadas na assinatura do consentimento informado. Segue-se uma fase de entrevistas, individuais ou conjuntas, em que se avalia a história familiar, o percurso escolar e profissional, a história relacional (passada e presente), antecedentes pessoais, informação sobre o ex-cônjuge (ex. relacionamento deste com os filhos), guarda e custódia, assim como a história do desenvolvimento e escolar da criança, problemas evidenciados, relacionamento com os pares, impacto da separação e/ou divórcio, expectativas do menor acerca da custódia, rotinas, regime de visitas e comportamento do menor com cada um dos pais e com as praticas educativas por cada um adoptadas.
São utilizados questionários que se destinam essencialmente à avaliação da personalidade, no entanto pode recorrer-se a testes específicos para avaliação, por exemplo, das práticas educativas, das crenças sobre a punição física ou sobre as fontes de stresse na relação pais-filhos. Pode também recorrer-se a técnicas projectivas, se o psicólogo possuir o domínio das mesmas. Fazem também parte do processo avaliativo as observações espontâneas (ex. sala de espera e no gabinete de consulta) e observações programadas (ex. gabinete de consulta com pedido de tarefas). Podem assim observar -se interacções pais-filhos, nomeadamente no que se refere à expressão emocional, comunicação, estabelecimento de limites, reforços utilizados, competências didácticas, gestão de conflitos e prestação de cuidados. Podem estar ainda presentes procedimentos complementares, como o recurso a familiares significativos, como avós ou outros, potenciais informadores acerca da criança, do seu desenvolvimento e funcionamento actual e sobre os papéis que estes familiares têm na vida da criança. A recolha de informação junto à escola/professores pode ser útil na medida em que se recolhe informação sobre a criança a nível de aprendizagem, relação com os pares, respeito pela autoridade e sobre o envolvimento dos pais na vida escolar da criança.
O processo de avaliação das competências e capacidades parentais reveste-se de uma relativa subjectividade, por um lado por via da grande activação emocional em que habitualmente decorre, por outro lado, pela subjectividade da expressão “superior interesse da criança”. Por esta razão, o psicólogo deve fazer uma avaliação compreensiva, sistémica e ecológica, no sentido de incluir todos os sistemas que fazem parte e influenciam, intervenientes no processo. Deve também munir-se de toda a sensibilidade possível, para poder detectar situações como alienação parental ou vitimização infantil instrumentada.
Sugestão de leitura:
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