A vinculação humana e as relações interpessoais futuras

Podemos entender a vinculação como um laço emocional profundo e duradouro que une duas pessoas. Em psicologia, a palavra vinculação remete-nos para a relação mãe-bebé e pressupõe um comportamento instintivo, decorrente da necessidade básica de sobrevivência e de segurança.

Falar de vinculação é falar do estabelecimento de uma relação do bebé com uma figura de referência (e. g. mãe), através de comportamentos inatos de promoção e manutenção da proximidade. Desta relação resulta o desenvolvimento das representações mentais sobre si próprio, sobre os outros e sobre os relacionamentos. Da mãe (ou outro cuidador), espera-se a satisfação das necessidades básicas do seu bebé de forma a assegurar a sua sobrevivência e a proporcionar a segurança necessária ao seu desenvolvimento saudável. A vinculação é um comportamento universal e transcultural, que nasce dessa interação e que é a base para o desenvolvimento socio-emocional da criança, tendo grande influencia no modo como a ela vai vivenciar os seus relacionamentos interpessoais e desenvolver competências relacionais futuras. A vinculação é ainda determinante no modo como a criança vai “explorar” o mundo que a rodeia.

O processo de vinculação passa por cinco fases distintas, cada uma delas com diferentes “tarefas”. A primeira é a fase da indiferenciação, em que as reações do bebé são reflexas e indiferenciadas, havendo incapacidade de distinguir estímulos sociais de estímulos não sociais. Na segunda fase a discriminação é limitada e o comportamento do bebé não é ainda orientado para uma pessoa específica. Nesta fase, há já o recurso ao olfato, audição e outros estímulos que orientam a criança a seguir com o olhar, agarrar, sorrir ou parar de chorar perante uma voz ou um rosto. A terceira fase caracteriza-se pela capacidade em diferenciar a principal figura de referencia/cuidador e o desenvolvimento de preferência pelo mesmo para a procura de segurança, conforto e proteção, podendo a criança evidenciar algum desconforto quando é separada do cuidador principal.

Na quarta fase a criança já procura proximidade através da locomoção, já adquiriu capacidade para diferenciar as pessoas conhecidas dos estranhos e utiliza a figura de vinculação como “base segura” para a exploração do meio. A quinta e ultima fase é corresponde à sofisticação dos sistemas comportamentais, em que a criança já adquiriu uma maior capacidade para aceitar separações mais prolongadas das figuras de vinculação e uma crescente capacidade de exploração do meio. Nesta fase a criança adquire a “teoria da mente” e uma construção sobre os estados mentais das outras pessoas. O processo de vinculação inicia-se no nascimento e termina por volta dos 3 anos.

Podemos distinguir 4 tipos de vinculação: segura, insegura-evitante, insegura-ambivalente ou insegura-desorganizada. Como se pode inferir pela nomenclatura, o tipo de vinculação segura é o mais benéfico para o desenvolvimento infantil. A criança perceciona o cuidador como sendo de confiança e recorre a ele em situações de perigo ou ameaça, da mesma forma que reage de modo afável aquando do reencontro após a ausência do mesmo. A criança com uma vinculação segura procura proximidade e contacto com a sua figura de referência e sente-se segura para explorar o meio de forma independente.

Na vinculação insegura-evitante caracteriza-se o cuidador como alguém que não identifica ou que rejeita as necessidades da criança, não as satisfazendo adequadamente. A criança não o consegue considerar como a sua base segura e pode mesmo evitar o contacto com essa figura. Neste tipo de vinculação a criança tende a não reagir negativamente à ausência do cuidador. As crianças com vinculação insegura-evitante tendem a suprimir a sua vulnerabilidade e dependência de terceiros. A vinculação insegura-ambivalente caracteriza-se por cuidadores inconsistente na satisfação das necessidades das suas criança e por crianças que não consideram o seu cuidador como uma base segura. Estas crianças apresentam frequentemente ansiedade ou zanga na sua relação com o cuidador e ao mesmo tempo uma necessidade em monitorizar a sua localização. A relação da criança com o seu cuidador oscila entre proximidade e a hostilidade face ao mesmo, sendo que a criança tende também a apresentar dificuldade na expressão emocional e na exploração do meio.

Por fim, o estilo de vinculação inseguro-desorganizado caracteriza-se essencialmente por uma atitude do cuidador marcadamente insensível e inconsistente das necessidades da criança. Estas crianças não consideram o cuidador como uma base segura e podem mesmo apresentar comportamentos contraditórios, incoerentes e bizarros, numa busca angustiada de proximidade. O medo do cuidador está muitas vezes associado a este tipo de vinculação que por sua vez está associado a situações de abusos e maus-tratos. O padrão de vinculação influencia o processamento de informação respeitante às relações interpessoais. As atitudes e expectativas sobre os outros, a gestão das emoções no contexto das relações, o comportamento interpessoal, a capacidade de regulação emocional e de comunicação são aspetos da vivência socioemocional do indivíduo que são fortgemente influenciadas pelo estilo de vinculação que desenvolveu com a sua figura de referência/cuidador, sendo um importante preditor da natureza e qualidade das relações interpessoais futuras.

Fontes:

Bowlby, J. (1988). A secure base: Parent-child attachment and healthy humam development. London: Routledge.

Bowlby, J, Ainsworth, M, Boston, M. & Rosenbluth, D. (1956). The effects of mother-child separation: A follow-up study. British Journal of Medical Psychology.

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