Luto normal e luto patológico

Ao longo do nosso curso de vida enfrentamos algumas inevitáveis perdas significativas. À nossa reação emocional a essas perdas, chamamos luto. O luto é um processo normal e necessário, porém, por vezes pode tornar-se patológico, podendo levar estados de doença, nomeadamente à depressão.

Perdemos amigos ou familiares, animais de estimação, a saúde, o emprego, enfim, as perdas podem ser de diversas naturezas. Perante uma situação de perda temos a necessidade de expressar os nossos sentimentos de tristeza e desânimo. O período no qual decorre este processo é variável e os sintomas apresentados por cada indivíduo também podem ser diversos. Tipicamente ocorrem sentimentos de apatia e abatimento, perda de interesse no mundo exterior e diminuição na atividade e iniciativa. Estas reações são semelhantes à depressão, mas são menos persistentes e não são consideradas patológicas (APA, 2010, p. 586). Apesar de o fenómeno do luto ser universal, o seu significado é multifacetado na experiência de vida humana, uma vez que existem grandes diferenças em relação á forma como cada indivíduo reage às suas perdas.

O processo de luto, como já foi referido, pode definir-se como um processo que gera um conjunto de reações diante de uma perda. O luto é uma fase de expressão dos sentimentos decorrentes dessa perda, a qual pode ser demonstrada tanto por reações de choque e desorganização como pode ser elaborada de forma organizada e sem problemas graves. O processo de luto normal (organizado) habitualmente dá-se quando em caso de morte, esta é aceite como algo real e natural e quando o sujeito enlutado apresenta disponibilidade para novos investimentos na sua vida. Esses novos investimentos sugerem a reorganização da nova rotina quotidiana, quer funcional como emocional. O processo de luto normal caracteriza-se assim por esse investimento saudável, ao contrário do luto patológico, que ocorre quando há a intensificação dos processos presentes no luto normal, tanto em relação ao tempo de duração, como em relação ao comprometimento provocado pelos sintomas. Estes sintomas assumem um caráter irreversível, integrando-se a vida do enlutado. Num processo de luto patológico, o indivíduo não consegue reorganizar a sua vida e construir novos projetos para o futuro.

Segundo alguns autores, o processo de luto espera-se que decorra em cinco etapas: a negação, a raiva, a negociação, a depressão e a aceitação. A fase da negação pode ser vista como um mecanismo de defesa para lidar com algo difícil de aceitar – a perda. Nesta fase pode haver uma tendência para racionalizar a situação e minimizar o impacto que ela tem e terá nas nossas vidas, negando o ocorrido. A fase seguinte é a raiva. O enlutado direciona a raiva a todos os que lhe são próximos ou pode também sentir raiva de si mesmo, por não ter feito alguma coisa de forma diferente, acabando também por se culpabilizar. A fase seguinte caracteriza-se pela negociação, em que a pessoa em luto compreende que a raiva que sente não muda o que aconteceu. Começa a adquirir mais paz interior e serenidade e continua ou retoma as suas rotinas. Segue-se a fase da depressão, que pode ser um período pós perda em que é natural que possa haver uma sensação de cansaço extremo, tristeza e o choro fácil, podendo o enlutado ficar mais silencioso, isolar-se e ter alterações no apetite ou no sono. De uma forma geral, fica emocionalmente mais fragilizado. Por fim, a aceitação, fase em que a tristeza e a saudade poderão ainda estar presentes, porém, já começa a ser possível pensar no futuro e sentir que mudanças positivas poderão acontecer.

Cada uma destas etapas, inerentes ao processo de luto saudável, é experienciada pelos diferentes indivíduos de forma distinta. Por vezes, a pessoa em luto pode não passar por todas as etapas, ou pode ainda em alguns casos, ver a sua ordem alterada. Quando o indivíduo não consegue lidar com a situação de perda de forma adaptativa, pode instalar-se então o luto patológico. Este estado emocional deve ser compreendido como um estado em que o indivíduo nega, reprime ou evita aspetos da perda, apresentando resistência em se desligar da pessoa que faleceu. Este processo pode desencadear sintomas psicológicos, comportamentais, sociais e físicos, ou até mesmo sérias perturbações mentais.

 Pode acontecer que o indivíduo em luto fique preso numa das fases anteriormente descritas, sem conseguir avançar e elaborar o trabalho do luto de uma forma saudável. Numa situação deste tipo, pode desenvolver-se um processo complexo de luto patológico, que interfere negativamente com o dia-a-dia e com as relações interpessoais do indivíduo. É necessário estarmos atentos a sinais que possam indicar um luto patológico tais como: tristeza profunda, isolamento social, perturbações do sono, ideação suicida, entre outras. Se num processo de luto normal, o acompanhamento psicológico pode ser uma ajuda e potenciar a sua boa resolução, tornando o processo menos doloroso, num processo de luto patológico, esse apoio é ainda mais necessário. A pessoa em luto patológico tem a oportunidade, na relação terapêutica, de expressar as suas emoções e a sua dor, e, ser ajudada a reconhecer e compreender a sua emocionalidade negativa, aprendendo a lidar com ela de forma a aliviar a sua angústia. A psicoterapia ajuda a identificar e resolver as dificuldades que impediram o enlutado de fazer um luto normal, e ajudá-lo a elaborar as tarefas do luto que não foram devidamente trabalhadas e a ultrapassar a fase do luto onde a pessoa possa ter ficado estagnada.

Fonte:

Cerentini, D., Duarte, E. R. C. L., Pergher, G. K. (2011). Terapia Cognitivo-Comportamental no Luto.  Novas Temáticas em Terapia Cognitiva. Porto Alegre.

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