Cansados da pandemia, cansados do confinamento

Após quase um ano de pandemia por Covid-19 em Portugal, o cansaço está a apoderar-se de muitos de nós. É um cansaço físico por redução da atividade, mas essencialmente psicológico devido às constantes adaptações às mudanças que nos foram impostas e que em tanto alteraram o nosso quotidiano.

Depois de terminarmos o fatídico ano de 2020 que tanta mudança operou nas nossas vidas, vimo-nos, ao contrário do que muitos esperávamos, confrontados com uma situação de aumento de casos de infeção por Covid-19 e consequentemente, um aumento de mortes e hospitalizações muito preocupante que puseram à prova a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde e dos decisores políticos. Bem ou mal, depende do entender de cada um, o confinamento foi decretado novamente e voltamos a ficar impedidos de levar as nossas vidas, com a “normalidade” a que já nos estávamos a habituar… Mas pelos dados que vão chegando ao nosso conhecimento, o confinamento está a ter eficácia, quer pelo decréscimo de número de novos infetados que se tem vindo a observar nos últimos dias, quer por algum desafogo nas unidades de cuidados intensivos. No entanto, não deixa de ser penoso, preocupante e altamente stressante o esforço que cada um de nós está a fazer para se manter confinado.

Se no primeiro confinamento tudo era novidade e os casos de doentes e mortes por Covid-19 estavam relativamente “longe” de muitos de nós, desta vez tem sido bem diferente. Todos nós conhecemos pessoas que estiveram infetadas, que tiveram contactos de risco e ficaram em isolamento profilático ou que estão em processo de luto por alguém que perderam em consequência da doença. Os casos de Covid-19 ganharam rosto, ficaram mais perto e muitas são as figuras públicas cujas vidas de algum modo acompanhamos, que vêm relatar as suas experiências com o vírus. Essa proximidade influencia a nossa perceção de risco e se por um lado nos ajuda a entender a necessidade de cumprir as regras do confinamento, por outro lado acresce em nós a preocupação e o medo de contrair a doença ou de ultrapassar os períodos de isolamento e a difícil logística doméstica que estes implicam.

A expressão “fadiga de pandemia” tornou-se comum para definir o que sente uma grande parte de nós que nos vemos obrigados a lidar com o impacto psicológico dos problemas sociais e económicos decorrentes desta situação em que vivemos. Com maior ou menor gravidade, cada um de nós acusa sofrimento emocional e desgaste psicológico. Os ansiosos ficaram mais ansiosos, os deprimidos não encontram grandes motivações para se poderem sentir melhor, e quem não estava nem ansioso nem deprimido, tem certamente passado por alguns momentos em que sintomatologia característica destas perturbações está presente. Ou porque têm a sua atividade profissional encerrada, ou porque o teletrabalho está a ser difícil de conciliar com a vida familiar, ou porque o distanciamento social está a ter repercussões práticas nas vidas dos que têm maiores limitações, todos à sua maneira acusam desgaste, cansaço e algum desalento. Até a esperança na tão aguardada vacina se vê algo comprometida com a aparente lentidão e falta de transparência do processo de vacinação em curso. Enfim, o futuro mantêm-se incerto e parece estar ainda distante o retorno à normalidade.

Perante este quadro, é natural que nos possamos sentir insatisfeitos, tristes, angustiados e com medo pois não temos nas nossas mãos o total controlo da situação ou a resolução da mesma. É também natural que nos sintamos preocupados e que o nosso sofrimento seja proporcional à realidade, mais ou menos exigente de cada um de nós. É também perfeitamente natural que nos sintamos zangados, revoltados, irritados ou impotentes, pelas mesmas razões. Por vezes podemos ter vontade de chorar, gritar ou “disparatar” com os outros por nos sentirmos condicionados nas nossas atividades e na expressão dos nossos sentimentos. Embora todas estas reações sejam naturais e comuns a muitos de nós, é mais do que nunca importante que consigamos identificar as nossas emoções e as dos que nos rodeiam, e que possamos lidar com elas com resiliência, autocontrolo e relativização.

O velho ditado popular “não há mal que sempre dure nem bem que nunca acabe” parece-me ilustrativo do que podem ser os ciclos de vida, que habitualmente oscilam entre momentos de felicidade e harmonia e momentos de dor e sofrimento. Tendo em vista o futuro, e acreditando que a situação pandémica irá terminar, vamos então tentar neste segundo confinamento repetir o que correu bem no primeiro e evitar o que correu pior, no sentido de minimizar os impactos negativos na nossa saúde. Para além disso, deixo aqui algumas “ferramentas” que o poderão ajudar a lidar com este período complexo.

  • Identifique e reconheça os seus pensamentos e as suas emoções. O modo como pensamos sobre algo vai influenciar a forma como nos vamos sentir e por sua vez, a forma como vamos agir. Relativizar os nossos pensamentos e compreende-los é meio caminho andado para não nos deixarmos cair numa emocionalidade negativa que nos fará agir de modo pouco adaptativo.
  • Aceite-se! Aceite os seus sentimentos e as suas características e não entre numa luta consigo mesmo por causa de algo que não pode controlar. Aceitar a situação e pensar que não está sozinho pode ajudá-lo a lidar com ela e a aguardar os resultados positivos do nosso esforço de permanecer em confinamento.
  • Faça uma retrospetiva da sua vida e pense quais foram as estratégias que o ajudaram a ultrapassar outros momentos que tenham sido difíceis para si. Se puder, volte a utiliza-las agora, adaptando-as à situação atual.
  • Tente disfrutar ao máximo dos momentos que lhe agradam. Um passatempo, um hobbie, uma conversa com amigos, ainda que à distância ou até mesmo aventurar-se em atividades que não eram habituais, podem fazê-lo descobrir novos talentos e novas competências.
  • Desafie o seu sentido de humor. Não desvalorizando a importância e o impacto da pandemia, fazer humor e rirmo-nos de nós próprios ou da situação pode ser uma ferramenta bastante eficaz para aliviar tensões.
  • Aprenda a lidar com a ansiedade. Aos primeiros sinais, não deixe que ele entre numa escalada que o possa tornar disfuncional. Aprenda a identificar os primeiros sinais do seu corpo e faça exercícios de relaxamento, respiração, meditação ou distraia-se simplesmente com algo de que gosta.
  • Partilhe com os seus familiares e amigos as suas emoções e os seus afetos. Embora à distância, não deixe de estar presente na vida dos seus e de partilhar com eles os momentos mais felizes mas também as suas preocupações. A interação social permite aliviar a tensão emocional. Dentro das suas possibilidades, procure ajudar outras pessoas que apresentem outras limitações e irá desfrutar de um sentimento de autoeficácia e satisfação.
  • Estabeleça uma nova rotina em que inclua as obrigações profissionais, as interações familiares e o lazer. Estabeleça objetivos claros e compatíveis com os condicionalismos a que estamos obrigados mas procure ao máximo cumpri-los.
  • Dê atenção á sua alimentação, beba água, procure fazer exercício físico e mantenha hábitos de higiene de sono. A sua saúde física não deve ficar esquecida e se for necessário recorrer a ajuda médica, não deixe de o fazer por receio. A fatura a pagar pode ser pesada.
  •  Se a sua rede de apoio social é limitada ou se sentir necessidade de apoio profissional, tem ao seu dispor a linha de aconselhamento psicológico do Serviço Nacional de Saúde, que através do número 808 24 24 24 (opção 4) disponibiliza apoio por profissionais credenciados, que podem fazer a diferença.

 Proteja-se e procure em si próprio recursos para lidar com este momento particularmente exigente, mas se precisar, não deixe de pedir ajuda!

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