A ansiedade na infância e a intervenção cognitivo-comportamental

Desde os primórdios da humanidade que nos deparamos com diversos perigos e ameaças à sobrevivência, tendo desenvolvido ao longo dos tempos, estratégias adaptativas de proteção ou de enfrentamento, para lidarmos com as mais variadas situações difíceis ou ameaçadores do quotidiano. Essas situações ocorrem ao longo do ciclo de vida e é desde crianças que devemos aprender a lidar com elas.

Perante uma situação ou acontecimento causador de stresse, o corpo humano está preparado para reagir de forma imediata à ameaça percebida. O cérebro recebe a mensagem de perigo eminente, produz e liberta substâncias químicas que desencadeiam sensações fisiológicas ou psicológicas, como a aceleração do ritmo cardíaco, o aumento da sudação, as alterações ao nível da respiração, os pensamentos de catastrofização e/ou de fuga, entre outras reações possíveis. Essas sensações e cognições têm como finalidade preparar o organismo para se proteger da ameaça e facilitar a reação de fuga ou enfrentamento do problema. Após um determinado período, de duração variável conforme a situação e o indivíduo, estas sensações diminuem por ação do sistema nervoso parassimpático, provocando uma sensação de relaxamento.

Todas as reações emocionais e cognitivas anteriormente descritas estão na base das Perturbações de Ansiedade, que podem afetar os indivíduos em todas as fases do ciclo de vida. Sempre que a ansiedade impede o funcionamento “normal” do indivíduo, com implicações negativas no seu quotidiano e no seu bem-estar, estamos perante um problema de saúde mental. A ansiedade patológica na infância tem um impacto muito significativo a vários níveis, nomeadamente na vida social e escolar das crianças, por vezes com consequências sérias, que não sendo tratadas podem persistir na vida adulta. Os fatores biológicos e hereditários estão associados ao aparecimento das perturbações de ansiedade. Filhos de pais ansiosos têm uma maior predisposição para apresentarem dificuldades ao nível da ansiedade. Por outro lado, os comportamentos associados á perturbação de ansiedade também são aprendidos desde a mais tenra idade. As crianças criam os seus modelos de funcionamento interno perante os acontecimentos de vida, tendo por base as suas relações com os seus cuidadores, habitualmente os pais. A própria relação conjugal, o estilo parental, as crenças parentais e a relação com irmãos, são exemplos de fatores que podem estar associados ao desenvolvimento de uma Perturbação de Ansiedade na infância.

Ao longo do seu desenvolvimento, as crianças vão sendo influenciadas por outras relações e por outros contextos, que podem ou não reforçar as suas dificuldades em lidar com a sua ansiedade. Esta perturbação na infância, pode assumir diferentes subtipos, desde a ansiedade generalizada, ansiedade de separação, ansiedade social, mutismo seletivo ou fobia específica. Em consequência dos problemas relacionados com a ansiedade, as crianças podem ver prejudicada a sua capacidade de memorização, atenção e compreensão de informação, com grande impacto negativo no seu desempenho escolar e progressão académica. A ansiedade pode também afetar o desenvolvimento das relações sociais, como as relações familiares e de amizade. Uma perturbação de ansiedade não tratada, pode conduzir ao desenvolvimento de sintomatologia depressiva, bem como a um inevitável decréscimo da qualidade de vida. Uma das intervenções mais eficazes no tratamento da ansiedade infantil é a Intervenção Cognitivo-Comportamental (TCC). Este modelo de intervenção psicológica baseia-se em teorias empíricas e de base científica, que combinam conceitos do comportamentalismo com teorias cognitivas. Tem por base a premissa de que, o modo como o indivíduo pensa sobre um determinado evento, vai influenciar a forma como vai reagir emocionalmente e em consequência disso, o modo como se vai comportar. Este tipo de intervenção foi fundada no início da década de 60 por Aaron Beck, neurologista e psiquiatra norte-americano, que propôs inicialmente um “modelo cognitivo da depressão” e que posteriormente evoluiu para a compreensão e tratamento de outras perturbações, nomeadamente as Perturbações de Ansiedade.

A TCC em crianças com Perturbação de Ansiedade envolve o ensino e treino de um conjunto de estratégias que visam a modificação do comportamento da criança face à ameaça percebida ou a crenças disfuncionais promotoras de stresse. O principal foco é a identificação dessas crenças e a modificação das mesmas para que a criança aprenda a lidar sozinha com o seu problema. A psicoeducação é fundamental para que tanto as crianças como os seus cuidadores aprendam e compreendam os conceitos básicos da TCC, como por exemplo o que são pensamentos automáticos e o que se pode fazer para os modificar. Através de registos simples sobre acontecimentos, pensamentos, sentimentos e comportamentos com eles relacionados, podemos encontrar o padrão de funcionamento cognitivo-comportamental da criança e adequar as técnicas de modo a tornar esse padrão de funcionamento mais adaptativo.

Existem técnicas de exposição á situação ou ao elemento causador de ansiedade, que podem ser utilizadas de forma a ajudar a criança a ultrapassar o medo. Essas técnicas podem ser extremamente eficazes, no entanto têm que ser utilizadas de uma forma muito gradual e com uma monitorização rigorosa, para que os seus efeitos sejam efetivos. A par das estratégias cognitivas, o relaxamento pode ser em enorme aliado para ajudar a lidar com a ansiedade. A criança deve aprender várias técnicas de relaxamento e treina-las, no sentido de perceber qual a mais eficaz para si. Deve em situações de stresse, identificar no seu corpo os primeiros sinais e utilizar a técnicas que mais se adequar as si ou á situação, para evitar uma “escalada” de ansiedade que se tornará mais difícil de controlar. Em suma, sentir ansiedade é normal e pode ser até bastante protetor, no entanto, sempre que se torna patológica e desadaptativa deverá ser alvo de intervenção, por uma lado para aliviar o sofrimento da criança e torna-la mais funcional, por outro lado, para evitar chegar a uma perturbação mais severa e que possa contribuir também para o aparecimento de outras perturbações, como por exemplo, a depressão.

Procure ajuda. A Sua Psicóloga poderá contribuir para o aumento da qualidade de vida da sua criança e para a melhoria do bem-estar familiar!

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